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quarta-feira, maio 09, 2007

Violência Como Sociopatia do Individualismo

Resumo: A abordagem deste artigo procura enfocar o aspecto do contexto individualista e a violência que este causa através do distúrbio da Personalidade Anti-social (sociopatia). Pelo fôlego deste texto, foi inserida, resumidamente, a idéia do Homem ser um Ser Social. No entanto, pelo movimento de individualização e pelas dinâmicas social-econômicas torna-se cada vez mais arredio em relação ao convívio pacífico com seus pares. Esta situação ocasiona distúrbios de personalidades que levam a atitudes antagônicas do socialmente sadio. A violência, de certa forma, é produto de dinâmicas sociais individualista-competitivas, em que o outro representa uma ameaça.

Palavras-Chave: Violência; individualismo; sociopatia.

SUMÁRIO: Introdução; 1. O Homem Como Ser Social; 1.1. O Homem na Sociedade Primitiva; 1.2. O Homem na Sociedade Moderna; 2. O Homem Anti-Social; 2.1. Distúrbio da Personalidade Anti-Social; 2.2. Sociopatia: A Violência do Individualismo; Conclusão; BIBLIOGRAFIA.

Introdução

É primacial para conhecer e compreender o Homem, em sua complexidade, uma visão holística, trans e interdisciplinar. No entanto, o fôlego deste trabalho é restrito. Por isso, para uma melhor visão do tema em discussão, percorrerei o caminho, aparentemente mais apropriado, ou seja, ter-se-á uma visão do Homem em sociedade (na primitiva/arcaica e na moderna), com a finalidade de aproximá-lo da discussão do individualismo e suas conseqüências na produção de desvios de condutas. As observações tecidas neste opúsculo sobre as sociedades são, apenas, peculiaridades dentro de um âmbito descomunal de diversidade que constitui a história da Humanidade.
O ser humano não vive isolado de seus pares. Necessita da convivência de seus semelhantes para não sucumbir aos sabores da natureza e, até, de sua própria fraqueza no isolamento. Com isso, um dos fatores que mais influenciam, ou o principal, dependendo do enfoque a ser trabalhado, na estruturação do caráter do homem, é o meio social em que vive. A coexistência com os seus pares determina a configuração do ser humano nas relações com o meio ambiente, tanto o natural como o social.
A admissão deste fator social é estruturante no entendimento da sociopatia, que tem seu distúrbio alicerçado nas excrescências do mundo social individualista-estético. A intensidade do problema aventado é elemento essencial, demonstrador da qualidade de vida, no seu sentido mais amplo, ou melhor, na abrangência das áreas: econômica, educacional, emocional, biológica etc. O deslocamento da visão do indivíduo, como membro de uma sociedade arcaica, que privilegiava o “nós” para a atualidade, prevalência do “eu” em detrimento do “nós”, causa um distanciamento de seus pares, uma individualização no seu “eu”, o que acarreta introspecção demasiada.
Desta feita, todos os fatores exógenos e endógenos incidiram e incidem na composição do ser humano social. Sua conduta, seus valores e todos os atributos que ele externa passam por uma filtragem do autocontrole, ou seja, a contenção dos instintos, até mesmo dos mais primários, como ensina Freud.
O autocontrole advém com a complexidade social, com a presença do Estado[1] e a divisão do trabalho, em que há uma retração do indivíduo em si mesmo. As especificidades das profissões começam a atuar sobre a competência, imagem que os outros têm de cada um, fato responsável por causar uma cisão social e uma divisão de classes, num plano orgânico. Cada um terá sua função no meio social e aqueles que atrapalham o funcionamento do corpo social serão taxados como estranhos e prejudiciais à sociedade.
Chega-se, destarte, à produção e reprodução dos distúrbios anti-sociais. A estrutura vigente, a individualista, leva a um afastamento das relações interpessoais, o que ocasiona a falta de afeto. Por sua vez, a mesma conduta individualista reproduz o comportamento anti-social, devido ao desleixo e exclusão com que trata os problemáticos, ou desviantes.
Destarte, este trabalho gira em torno de uma abordagem sociológica e psicológica, do homem, imerso numa cultura narcisista na sociedade do espetáculo, na qual importa somente a exaltação do seu próprio “eu”. O referido processo inicia com a locução do aspecto social e abrange a esfera psicológica do sociopata. A atuação dessas duas esferas do conhecimento se interliga de tal maneira, que a ação de uma causará reflexos na outra e o contrário é verdadeiro. Constituindo-se, uma via de duas mãos.

1. O Homem Como Ser Social

1. 1. O Homem na Sociedade Primitiva

O Ser Humano é um ser muito distinto dos demais animais, diferenciando-se pela sua racionalidade e por ser dotado de uma linguagem articulada. Outro aspecto intrínseco ao Homem, mas que encontramos em algumas outras classes de seres vivos[2], é a necessidade de pertencer a um meio social, ou seja, conviver com os seus semelhantes, numa comunidade, sociedade[3].
A solidão, o isolamento de seus pares torna o homem vulnerável inviabilizando de, em longo prazo, sobreviver. A própria subsistência da espécie humana necessita de um contato interpessoal, haja vista a relação sexual entre o homem e a mulher. Ainda, a criação sem o apoio de, pelo menos uma pessoa, inviabilizará a criança. A partir daí, marca-se a importância das relações sociais na vida humana.
Desde os primórdios dos grupos humanos, o homem viveu em sociedade, ou seja, agregado aos seus pares; embora, no entanto, a solidariedade, a coesão grupal fosse por vezes mais fraca ou/e mais forte, conforme a situação vivida pelo grupo. Isto decorre desde a sociedade nômade, na qual todo o grupo se deslocava pelos campos desérticos à procura de um lugar que suprisse sua necessidade de alimentação. Após algum tempo, quando determinado local apresentava escassez de alimentos, o grupo todo migrava à procura de outra paragem. Note-se, que, geralmente, esses grupos eram guiados por algum líder, que organizava a formação da sociedade e determinava o momento de começar nova peregrinação em busca de alimentos[4]. Quando o homem percebeu que poderia, fixo em determinado espaço, produzir seu alimento, começou a se estabelecer em comunidades fixas, ocupando certo espaço. A partir de então não havia a necessidade de deslocamento em busca de alimento. Da constatação da possibilidade de produzir seu alimento, começa a surgir o excedente na produção e, por conseqüência, o comércio vem à tona.
Além dos nômades, há outras sociedades com suas organizações sociais primitivas, que se mantinham coesas, como tribo, clã, famílias, etc.[5]. Cada indivíduo, detinha, perante o grupo, uma função. A junção de todos exercendo suas funções possibilitava a manutenção do grupo. A cooperação de cada um no meio social, era direcionada para o bem do grupo e sua manutenção, pois a necessidade de manter o organismo social vivo garantia-lhes sua própria sobrevivência. Isto porque essas organizações eram restritas, ou seja, pequenas no seu tamanho, tendo a premência de uma maior solidificação da solidariedade mecânica[6], em todos os sentidos, para a não extinção. É importante ressaltar que nestes grupos também havia “chefes”, lideres que organizavam e coordenavam o funcionamento da tribo. Sua dominação, de regra, advinha de alguma qualidade que o grupo reconhecia nele. Conforme WEBER, essa dominação era exercida através da tradição ou do carisma do líder[7].
As sociedades primitivas aqui referidas são aquelas que tinham sua organização de forma simples, baseada num líder, e seu campo de atuação restrito ao pequeno espaço.
Ao longo da história encontramos sociedades avançadas, aparentadas com o grande Estado de hoje. Os Gregos[8], os Egípcios[9] e, antes da formação do Estado Moderno, o Império Romano.
O importante, no entanto, é destacar a imprescindível necessidade do homem de viver em grupo e, além do mais, a constatação que no interior das sociedades primitivas/arcaicas havia uma diferenciação de classes, ou melhor, de funções. Embora, ao tempo, essa divisão de funções, intra-sociedade, tivesse a mesma importância para todos, ou seja, todos se encontravam no mesmo patamar. Era, praticamente, um comunismo, apenas havia um(ns) líder(es).
Os alicerces sociais garantiam a vida do indivíduo. Tanto isso era essencial que a pior pena que um membro do grupo podia receber, não era a pena capital, mas o banimento da tribo, ficando ao léu num mundo selvagem sem o manto protetor da sua comunidade. Logo após aplicada essa pena sucumbiria à natureza, pela angústia do isolamento ou seria morto por outro grupo.
Nestas sociedades, desta forma, tínhamos um quadro de integração social entre os indivíduos. Vivia-se e trabalhava-se para a subsistência do grupo como um todo e, de maneira reflexa, acabava preservando a sua vida. O indivíduo não tinha a clareza que sua sobrevivência dependia da manutenção do grupo mas que ele deveria trabalhar pelo seu grupo social. Dava-se maior importância ao coletivo do que ao individuo.

1. 2. O Homem na Sociedade Moderna

Do momento que começou a dilatação do círculo social[10] (descaracterização do clã, tribo etc.)[11] até o advento do Estado Moderno, embora o ser humano dependesse do grupo, vivia em constante disputa de poder com seus pares. Esta disputa concentrava-se na violência física. O vencedor era aquele que, pela sua força e astúcia, acabava derrotando seu oponente, matando-o ou escravizando-o, quando não o expulsava de determinado local. Por esse meio, se conquistava o maior bem da época, o espaço territorial. O território era de vital importância, pois neste espaço se produziria o alimento necessário, no primeiro momento, para se auto-sustentar e num segundo momento para subsistir e comercializar.
Foi, então, após séculos, se formando feudos que se constituíam pelo trabalho de vassalos e de pessoas que se vinculavam ao senhor feudal, trocando seu trabalho pela segurança e um pedaço de terra para alimentar-se. Ainda, os vassalos formavam, além de produzir para o senhor, o exército do feudo, que detinha a função de defender e de conquistar outros territórios.
Geralmente, os senhores de terras eram guerreiros bem sucedidos, vistos pelo seu grupo como os mais fortes e, de vez em quando, invencível. Coordenam, pelo seu poder, a administração do território e mantêm os seus vassalos coesos. No entanto, conforme as conquistas do exército (do feudo) o território ganhava em extensão, tornando o domínio do Senhor difícil. Assim, como prêmio e para facilitar o controle do “dono da casa grande”, este divide seu vasto território em regiões, delegando seu controle aos melhores “soldados” e seus familiares[12]. Fracionou-se, assim, o território.
Outrossim, com a dinâmica de conquista por mais espaço territorial foram se formando, séculos mais tarde, vastos territórios. Para o controle do Império, o soberano criava e distribuia cargos administrativos (a burocratização) surgindo, assim, a divisão do trabalho. Neste estágio, o Senhor feudal já se constitui em Rei. O feudo mais “poderoso” (em capital monetário e força bélica), se constitui em Estado, advindo, desta forma, o Estado Moderno[13].
O Estado Moderno, mesmo no seu inicio, concentrado na figura do Rei, se caracteriza pela divisão do trabalho e pela monopolização da tributação e força física (exército). Da divisão do trabalho, nasce uma nova maneira de relacionamento entre os indivíduos. Passa-se da disputa de poder pelo meio da violência para a disputa de poder pelo viés da competência, conhecimento (inteligência). O autocontrole[14] tende a ser mais exigido das pessoas, e se torna uma condição, sine qua non, para o bom convívio social. A violência física se constitui em uma conduta anti-social. Com isso, o relacionamento começa a se tornar mais “civilizado” e a constituição de classes dá-se de maneira principalmente econômica, mas, também, comportamental[15].
Embora, nesta fase, as pessoas já co-habitam cidades, demonstrando uma tolerância no convívio com seus semelhantes de localidades diversas, com costumes diversos, profissões distintas e, ainda, demonstrando maior interdependência dos seus pares, acabam acirrando suas diferenças. Melhor dizendo, com as cidades e a divisão do trabalho, cada qual exerce uma função; no entanto, não é apenas um a exercer uma única função, mas vários a exercer a mesma tarefa. O grupo, assim, não depende mais daquele indivíduo, que trabalhava em prol do bem coletivo, mas de indivíduos que laboram pelo seu próprio bem. A solidariedade do grupo passa para a preocupação consigo (o “eu”) mesmo e no máximo com sua família, que é, hodiernamente, considerada uma formação bem menor que no passado.
As alterações sofridas pelo Estado, através da Revolução Francesa, logo após com a Revolução Industrial (marcos históricos), ou seja, sua limitação de poder e modificação em suas estruturas, principalmente na seara da economia, iniciaram as transformações das relações entre os sujeitos de um cooperativismo tribal para o individualismo feroz da “aldeia mundial” globalizada[16].
Destarte, a coesão do corpo social é traçada pela competição intragrupo. A base econômica se constitui, desta forma, no parâmetro entre os bem e mal sucedidos. Daí, também, decorre a divisão de classes e a exclusão social. Dá-se, então, num ambiente mais próximo fisicamente, maior distanciamento entre as pessoas, no aspecto da solidariedade. Com isso, temos um individualismo, no qual o indivíduo tem apenas compromisso consigo deixando de lado os seus pares e apenas se aproximará, na maior parte das vezes, de outra pessoa com a intenção de se beneficiar. Contrapõe-se a essa situação com o passado de cooperação dos indivíduos nos grupos arcaicos, tribos, clãs...
A Revolução Francesa[17] implantou uma nova ordem, ou seja, retira-se a obrigação das mãos de um homem (Rei) transferindo para as mãos de todos cidadãos o controle. No entanto, isso é somente aparência. O controle do poder fica nas mãos de uma elite econômica que detém, por meio de uma dita democracia, o aparelho estatal, governando os súditos[18]. A classe dominante, através de um recurso de retórica e da estruturação da culturalização dos cidadãos, consegue difundir na consciência de todos, consciente ou inconscientemente, a pseudo-responsabilidade da sociedade pela conduta do Estado, por uma dita democracia.
Com a passagem da responsabilidade do destino do Estado aos indivíduos exacerba-se o individualismo e a economia de mercado fortalece a competição entre as pessoas. O Estado, hodiernamente, apenas garante o mínimo aos seus súditos que acabam competindo entre si, num jogo de poder, em que os melhores conseguirão o sucesso, o respeito e admiração dos demais. Os fracassados, e só serão fracassados pois não tiveram competência para o alcance do sucesso, serão excluídos do convívio da classe média e rica da sociedade, sendo isolados e estigmatizados (rotulados).
Extingue-se, na sociedade moderna, a solidariedade mecânica e passa-se para a solidariedade orgânica[19]. O grupo é apenas uma forma de ascensão ou referência da localização de classe. A sobrevivência não mais depende do aspecto coletivo, mas passa para as próprias forças econômicas individuais no ambiente globalizado[20]. Prepondera o aspecto individualista do “eu” sobre o coletivo do “nós”. Por meio desta força compra-se os meios essenciais à vida. No entanto, estes meios essenciais à vida serão fornecidos por outros humanos. Desta forma, o contato com seu semelhante não cessa por completo.

2. O Homem Anti-Social

A visão acima exposta remete e leva a uma conclusão óbvia, mas que traz implicações sérias ao homem como ser social e sociável. A conclusão que se retira é no sentido de que o Homem é um ser social, ou seja, ele não é uma ilha em si mesmo, necessita de outros humanos para sobreviver. Portanto, vive em contato e no meio de seus pares.
Por isso, o comportamento anti-social é a excrescência da atuação de uma pessoa em seu meio. Não é, portanto, normal uma conduta que demonstre repúdio ao seu grupo ou aos seus pares. Logicamente, pela racionalidade e, por vezes, pela emoção (impulso) o indivíduo pode, esporadicamente – reagindo a uma provocação, defendendo a si ou a terceiro -, praticar ações anti-sociais. No entanto, isto não se deve tornar constante. Quando houver a constância de comportamentos anti-sociais, o Homem pode ter adquirido o distúrbio da personalidade anti-social. Encontramos, destarte, uma pessoa com problemas de convivência em grupo, como veremos.

2. 1. Distúrbio da Personalidade Anti-Social

O Homem, ao nascer, traz os mecanismos de desenvolvimento dos dispositivos de socialização, ou melhor, de adaptação ao meio com o qual se relacionará. O primeiro contato, que de toda a forma é um modo de relacionamento com outro ser humano, é com os pais. Estes educarão[21] a criança, possibilitando a viabilidade de inserção no mundo social. Então, desde puerícia o indivíduo é sujeito do processo de sua adaptação. Sua personalidade[22] será moldada conforme influências e situações recolhidas do mundo, ocorrendo a conformação ao ambiente social.
Os traços genéticos, também, são muito importantes pois dão o tom da personalidade como ser emocionalmente instáveis ou estáveis. No entanto, este aspecto biopsicológico se encontra fora do fôlego deste trabalho. É importante destacar o aspecto genético na influência da carga hereditária que trazemos dos ascendentes.
A adaptação se dá através de dois processos: assimilação e acomodação (para JEAN PIAGET)[23]. Destarte, as noções de certo e errado, de bom e ruim e toda a carga de valoração em relação ao comportamento de si próprio e dos outros são aprendidos e, certamente, influenciarão toda a vida da pessoa. A personalidade sadia requer uma educação e modelos sadios. É necessário que se oferte toda a condição indispensável ao desenvolvimento da criança, seres indefesos, suscetíveis a todo o tipo de impropério, para conduzi-las a serem Homens equilibrados. A delimitação do caráter do ser humano é de cabal importância para a sociedade. Desta feita, decorrerá a constituição de um ambiente social equilibrado ou não. O conjunto de vários aspectos deve ser relevado na formação/construção do perfil psicológico humano[24].
O distúrbio da personalidade anti-social[25] é uma incapacidade de conformação às regras sociais e falta de empatia com os outros. É caracterizado por atos delitivos, ou seja, anti-sociais, “mas não é sinônimo de criminalidade”[26]. Os sociopatas, são, exteriormente, normais, podendo até ser fascinantes e geralmente impressionam (provocam encantamento) o sexo oposto pela sua exuberância e charme, são muito sedutores. Outrossim, revelam-se, durante a infância, com aleivosias, violências físicas, fugas de casa, pequenos furtos – até roubos – e uso de drogas, se estendendo até a idade adulta. São manipuladores de situações na intenção de levar vantagem, de preferência econômica (chamados “vigaristas”)[27], sobre os outros. Ainda, tendem a ter uma boa capacidade intelectiva e cognitiva, impressionando a vítima com seus argumentos[28] mentirosos. “Existe também, na Personalidade Anti-Social, há uma tendência de culpar os outros ou a fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade” (Balone, 2003). Capta, de forma impressionante, a angústia de sua vítima e com a presteza de sua lábia engana-a, explanando justamente o que ela (a vítima) queria ouvir.
Este distúrbio apresenta maior incidência nos grupos débeis e desestruturados social-educacional-economicamente[29]. A falta de condições na estruturação da personalidade da criança, de forma adequada, ocasiona uma elevada constatação de pessoas oriundas destes meios pobres da sociedade com o distúrbio. Mas isso não afasta as classes mais favorecidas de, no seu meio, surgirem personalidades anti-sociais. Pode-se, desta maneira, de forma parcial, admitir influencia do meio social de maneira cabal no indivíduo.
Observa-se que de muito a sociedade, como um todo, influencia no próprio comportamento de seus membros. No entanto, o primeiro elemento a ser considerado, neste conjunto de influências, é o elemento, que de forma imediata, age sobre o indivíduo, ou seja, a família, o grupo da rua e bairro onde reside, a escola, a cidade e por ai vai até o maior elemento que é o aspecto Mundial. Isso sem contar o elemento genético.
Pode-se, destarte, diagnosticar da seguinte maneira:

“Diagnóstico. Como mencionado, estes pacientes podem mostrar-se serenos e dignos de credibilidade ao entrevistador. Entretanto, sob a aparência (ou, para utilizar o termo de Hervey Cleckley, a ‘máscara de sanidade’), existe tensão hostilidade, irritabilidade e raiva. Entrevistas de estresse, nas quais os pacientes são vigorosamente confrontados com as inconsistências de suas histórias, podem ser necessárias para revelar a patologia. Mesmo os clínicos mais experientes têm sido enganados por tais pacientes.
Uma investigação diagnóstica completa deve incluir um exame neurológico minucioso. Uma vez que estes pacientes freqüentemente exibem EEGs anormais e leves sinais neurológicos sugestivos de um dano cerebral mínimo na infância, estes achados podem ser usados para confirmar a impressão clínica. Os critérios de diagnóstico do DSM-III-R (...).
Uma vez que o distúrbio da personalidade anti-social se desenvolva, segue um curso irremitente, sendo que o auge do comportamento anti-social geralmente ocorre no final da adolescência. O prognóstico é variável. Há relatos de diminuição dos sintomas com a idade. Muitos pacientes desenvolvem distúrbios de somatização e têm múltiplas queixas físicas. Depressão, alcoolismo e abuso de substâncias são comuns.” (Kaplan e Sadock, 1990: p. 460)

Em corroboração, a imediata influência coletiva na atividade do anti-social, o tratamento, traz a lume a função socializadora do grupo. No momento em que o paciente se encontra acolhido pelos seus pares e se vê na condição de igualdade, haverá um estímulo para a mudança. O carinho, a compreensão, o apoio, contribuirão para que desapareçam os aspectos anti-socais – o aspecto frio, desprovido de culpa, a incapacidade de assimilar a experiência...[30].
É importante que o terapeuta estabeleça fortes limites, encontrando uma maneira de relacionar-se com o comportamento autodestrutivo do paciente. Este, por sua vez, poderá tentar fugir do tratamento humanizador. Isto ocorre, pois, geralmente foi-lhes, na infância, negligenciado o carinho, a ternura, os cuidados parentais e paternais devidos. O desleixo com que foram tratados na tenra idade é, de uma forma, demonstrada pelo grupo que o está tratando, sentindo-se querido e integrante de uma família.
Nota-se a cabal importância da receptividade social a um indivíduo. Sua constituição psíquica terá maiores possibilidades de ser sadia se durante sua formação for lhe provido todos os meios para seu sadio desenvolvimento.

2. 2. Sociopatia: A Violência do Individualismo

As solidariedades grupais das antigas sociedades já se extinguiram. Com o desenvolvimento social, o agrupamento de diversas etnias em regiões próximas e a formação da cidade, perde-se a referência familiar que havia de um grupo inteiro. A família se restringe, desta forma, ao um pequeno conjunto ligado afetivamente, seja por causas oriundas do sangue, seja por afetividade ou até mesmo por questões econômicas.
Esta agregação de etnias diversas se deu de maneira secularizadora e por meio do processo civilizador da economia. Após o homem descobrir uma função para o excedente da produção; primeiramente a troca, logo a comercialização, as relações entre as pessoas começam a basear-se pelo vínculo econômico, principalmente. Esta ligação é frágil e tênue deixando um espaço vazio de afeto entre os indivíduos. Neste momento, inverte-se o postulado kantiano, que se constitui as coisas como o fim e as pessoas como o meio. Para acirrar o ambiente social, advém a divisão do trabalho; com isso, há uma maior especificidade em cada função; a diferenciação dos indivíduos se exacerba, não há mais semelhanças, mas diferenças. A coesão só se mantém pela solidariedade orgânica.
A conexão forte que ligava o indivíduo ao grupo se extingue, cedendo lugar ao espírito de individualismo[31], ou melhor, o sujeito percebe que sua existência não depende da conjunção de forças do grupo mas de sua própria força, interagindo com os outros para o suprimento de suas necessidades, como sociais, biológicas e psicológicas.
As pessoas são deslocadas de uma entidade “total” (sociedades arcaicas) para sub-entidades estratificadas. Elas se encontram, em última análise, estigmatizadas pela primeira impressão, a imagem, a sua função, que, por sua vez, se localiza numa classe social. Há um isolamento que nas sociedades primitivas não havia. Neste ponto, encontra-se o contra-senso. Fazem parte de uma sociedade mais extensa e ao mesmo tempo as pessoas são alocadas e encaixadas numa classe deste grupo que atribui a elas um status de estranho, marginal[32].
Nesta toada de relações superficiais, o indivíduo, alienado ao sub-sistema, se interioriza, concentra-se na sua individualidade[33]. Simplesmente coabita no meio social, fisicamente e psiquicamente isolado, cada um imerso na sua própria individualidade. Individualidade reforçada pela cultura narcisista da atualidade, em que a aparência é mais valorada do que a própria essência. A sociedade do espetáculo[34], do glamour do consumismo[35] e do enfraquecimento da alteridade compõe a estruturação do “eu”.
Este processo civilizador vem atuando no indivíduo quando criança, seja pelo tratamento usado pelos pais ou a educação recebida para enfrentar um mundo no isolamento do individualismo. O “eu” prevalece sobre o “nós”. Precocemente a criança vai entronizando, no processo de adaptação, uma idéia de mais valia da competição. E recebe, ainda, para potencializar seu espírito competitivo, a instrução de rejeitar qualquer aproximação do estranho, “inimigo”, ou marginal, segundo um modelo pré-formatado em sua concepção pela observação na sociedade dos excluídos.
Além disso, com as transformações sociais, as pessoas são instadas a controlar e a esconder seus afetos, instintos, intensifica-se o autocontrole como um meio de esconder-se dos demais. A tentativa de cada um volta-se a seguir um padrão básico de conduta. É tentar se socializar sem, ao mesmo tempo, expor-se, ou seja, continuar fechado na sua caixa individualizada. O comportamento exigido levará o sujeito a tornar-se, um igual dentro das suas peculiaridades. Caso haja a não observância da conduta imposta, e taxando de marginal.
O paradigma se transforma num paradoxo enlouquecido. Exige-se de um ser humano posições antagônicas. O Homem, como um ser social, precisa interagir com seus pares, - o contato é fundamental para a saúde e desenvolvimento sadio - no entanto, a modernidade com seu autocontrole e a divisão de classes impõem comportamentos individualizadores, direção oposta aos do socializador. Mas é preciso que se sigam os ditames sociais vigentes para não ser incluído na lista dos estranhos e, ser definitivamente, marginalizado. A pecha de pobre, marginalizado, incompetente é avassaladora na vida de qualquer pessoa[36].
Os pequenos grupos, sociedades arcaicas, tratavam seus membros como iguais. Mas com a criação do Estado e este sendo dominado por um pequeno grupo, o verso da moeda se torna a face mais admirada, começa-se a se tratar com os desiguais. A classe detentora do poder do Estado tem a capacidade de excluir, marginalizar aqueles que não seguem suas regras.
A repressão de seus impulsos, como autocontrole e via de individualização, ocasiona, numa pessoa desestruturada – econômica-social-educacionalmente – um distúrbio psicológico. O indivíduo, anteriormente ser sociável, se transforma numa pessoa que deve se autocontrolar, fechando-se em si mesmo. Faltando-lhe todo o aporte afetivo, muitas vezes negado pelos pais (de maneira consciente ou inconsciente) causando-lhe conseqüências graves. Além do mais, se pobre, carrega o estigma de delinqüente.
Desta forma, com essa “opção” de vida surgem as personalidades anti-sociais que representam a falência de uma sociedade que deveria ser fraterna e tolerante com seu próximo, mas que na verdade é autodestrutiva. Causa o mal a si própria, pois além de produzir em larga escala um ambiente inóspito ao desenvolvimento sadio do ser humano, marginaliza, de forma cruel, aqueles que, por circunstâncias impostas pelo próprio meio, acabam sendo condenados duas vezes, um bis in idem; ou melhor, geralmente, nascem num grupo que sobrevive em condições precárias, sendo vítimas de uma educação precária e de uma condição econômica abaixo do nível da pobreza (miserável) e, como se não bastasse, ao desenvolver o distúrbio da personalidade anti-social serão vítimas da perseguição do Estado através do Direito Penal e sua persecução. Este procurará excluí-los do sistema ao invés de fornecer o tratamento necessário.
Portanto, o individualismo causa sérias conseqüências na vida de todos. Inclusive pelo seu estímulo ao distúrbio anti-social.

Conclusão

As considerações feitas neste texto revelam uma faceta da sociedade, hodiernamente de consumo, anti-humanista[37]. A preponderância da importância do bem de consumo sobre o indivíduo, desloca-o para uma interiorização no “eu” hermeticamente fechado sem dar azo ao “nós” (sentido coletivo). Isto causa um acirramento das relações interpessoais, fato que determina o afastamento entre os indivíduos, que, inevitavelmente, acarreta atribulações no convívio social.
Os conflitos e a competição inviabilizam o fornecimento do devido afeto e atenção que cada indivíduo deveria receber do meio social. Sua imprescindibilidade da relação com os seus pares e o distanciamento dos próprios, constrói o ambiente fecundador de distúrbios anti-sociais. Sendo a classe pobre a mais atingida. As parcas condições econômicas, juntamente com a precária educação e a falta de assistência do Estado são cabais para a desconstituição ou má formação do caráter das pessoas.
A pior constatação, ainda, que pode ser trazida à tona, é a reprodução deste ambiente inóspito através das crianças que nascem em tal meio. A inação do Estado, que deveria prestar auxílio, só piora a situação posta. A miserabilidade, além de causar distúrbios desviantes, ocasiona outras implicações e reflexos na vida social[38].
A perfunctoriedade dos laços sociais é a mais veemente expressão do que ocorre na atualidade. A sociedade espetáculo (estética) só exaltará aqueles atores que souberem dançarem no ritmo da música. O descompasso acarretará sérias conseqüências psicossociais, como depressões ou síndromes, pânicos. A alteridade cedeu espaço para o individualismo narcisita-consumista afastando quaisquer consistências de laços afetivos.
A negatividade da imagem perante o grupo, muitas vezes, é determinante da interação social. Desta forma, a fragilidade da moldura comportamental não suporta o conteúdo, essência, contida no seu interior. Por isso, qualquer abalo na estrutura emoldural desencadeia uma seqüência de atitudes de libertação que vai de encontro com o comportamento social comum. Corolariamente haverá uma reação social, na intenção da manutenção do status, ou melhor, da estabilidade social.
Desta forma, pode-se concluir que há várias forças agindo sobre a psique de cada um de nós. Forças de libertação e de contenção, exógenas e endógenas, e que só se definirá o comportamento conforme a intensidade de cada força em determinados momentos.
No entanto, o autocontrole, exigido por fatores exógenos, principalmente a sociedade e seus padrões, tem, atualmente uma força descomunal na montagem do caráter e, por isso, é influenciador do comportamento individualista.

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PONTES DE MIRANDA, Francisco. 1983. Introdução à Política Científica. 2. ed, Rio de Janeiro, Forense.
WACQUANT, Loïc. 2001. As Prisões da Miséria. Rio de Janeiro, Jorge Zahar.
WIEACKER, Franz. 1997. História do Direito Privado Moderno. 2. ed, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian.

Sites Consultados

CHAVES, Gina Carneiro. Distúrbios da Personalidade: A Personalidade www.portugal-linha.pt/arteviver/personalidade.htm. 19 de maio de 2003.
BALONE, G. J. Comportamento Violento – 3 Personalidade Anti-Social. www.psiweb.med.br/forense/border2.html 1 de junho de 2003.
[1] “Embora estejam disponíveis outras imagens sociológicas do processo civilizador, a mais comum (e amplamente aceita) é a que impõe como seus pontos centrais a supressão de atos irracionais e essencialmente antissociais e a gradual mas persistente eliminação da violência da vida social (mais precisamente, a concentração da violência sob controle do Estado, onde é usada para guardar os perímetros da comunidade nacional e as condições da ordem social). O que funde os dois pontos centrais num só é a visão da sociedade civilizada – pelo menos na nossa forma ocidental moderna – como, primeiro e antes de mais nada, uma força moral; como um sistema de instituições que cooperam e se completam mutuamente na imposição de uma ordem normativa e do império da lei, que por sua vez preservam condições de paz social e segurança individual mal defendidas em cenários pré-civilizados.” (Bauman, 1998: p. 47-48).
[2] “As relações sociais existem entre animais, como ocorre com as abelhas, entre as quais há o trabalho em comum, com algumas divisões, de modo que se inicia a marcha – que elas não terminam – para a sociedade (senso estrito). Há animais que só admitem a solidão, e repelem contactos, mesmo entre os da mesma espécie, como ocorre com os grilos, com os pintarrochos (ditos cardeais), que vedam entrada no terreno que ocupam, e esses, postos na mesma gaiola, chegam, em luta, até à morte. Há animais sociáveis, inofensivos entre si. Há abelhas que põem as larvas a pouca distância das outras, sem que haja qualquer relação social entre elas. É o caso, por exemplo, da abelha Dosypoda. A escolha do lugar aproximou a colocação, sem que entre elas houvesse qualquer aproximação. Se o lugar muito lhe importa, para a nutrição ou outra atividade, há antílopes que marcam o seu território com secreção da glândula periorbitária em galho de árvore. O cão cheira o lugar a que o levaram, para saber se é de outro. Passa-se o mesmo com peixes.” (Pontes de Miranda, 1980: p. 5).
[3] Não distinguirei, neste texto, os termos comunidade, sociedade e nem coletividade, usando estes termos no sentido de conjunto de pessoas que vivem num ambiente social, ou melhor, que vivem em conjunto num determinado espaço.
[4] Geralmente este movimento social serve apenas para aquelas regiões onde os recursos para alimentação eram escassos. Assim era imperiosa a movimentação de todo o grupo. “O nômade é o povo cuja permanência nos lugares é mínima, ainda que oscile em torno de espaço, que é, por assim dizer, o seu território-núcleo, ao passo que tudo mais é complementar. Quando melhora outro lugar e a erva cresce, afluem as tribos pastoris da Ásia e do Sahara. Às vezes são tais migrações, que atingem a quinhentos quilômetros e às vezes mais, como os Larbas entre o Mzab e os mercados de Tienet-el-Had. Os Kirguizes vão dos vales do Ferghana aos planaltos do Alaí. O nomadismo não exclui a noção de território, tanto assim que os povos mais nômades o defedem. Nem tampouco a dos círculos sociais componentes de tal massa ambulante. A deslocação não desfaz os laços sociais.” (Pontes de Miranda, 1983: p. 38).
[5] “No clan, os indivíduos consideram-se parentes uns dos outros, mas só o reconhecem porque têm todos o mesmo totem é o ser animado ou inanimado, quase sempre animal ou vegetal, de que o grupo crê descender e constitui, para ele, emblema ou nome coletivo. Não entrou ainda, pelo menos visivelmente, o elemento territorial definido, o fator espaço-geográfico. Não é ainda o clan local, não é a tribo. Quando a cristalização se faz mais especial e hierarquizada passa-se do clan à família, grupo susceptível de evolução intrínseca; em vez da coexistência descentralizada do clan, vem a mais precisa regulamentação, com a diferenciação do poder e da responsabilidade, que deixam de ser indivíduos.” (Pontes de Miranda, 1983: p. 34-35).
[6] “Quando esta forma de solidariedade domina uma sociedade, os indivíduos diferem pouco uns dos outros. Membros de uma mesma coletividade, eles se assemelham porque têm os mesmos sentimentos, os mesmos valores, reconhecem os mesmos objetos como sagrados. A sociedade tem coerência porque os indivíduos ainda não se diferenciaram.” (Aron, 2000: p. 288). Classificação de DURKHEIM.
[7] “Dominação tradicional em virtude da crença na santidade das ordenações e dos poderes senhoriais de há muito existentes. Seu tipo puro é a dominação patriarcal. A associação dominante é de caráter comunitário.” p. 131. “Dominação carismática em virtude de devoção afetiva à pessoa do senhor e a seus dotes sobrenaturais (carisma) e, particularmente: as faculdades mágicas, revelações ou heroísmo, poder intelectual ou de oratória... A associação dominante é de caráter comunitário na comunidade ou no séquito.” (grifos do autor) (Cohn, 1997: p. 134-135).
[8] Os Gregos estabeleceram um sistema político que até hoje surte reflexos em nossa sociedade como exemplo de democracia, logicamente, com algumas diferenciações devido à época.
[9] “Tomemos um dos mais conhecidos exemplos de evolução. O Egito, mais de cinco mil anos antes de Cristo, já mostrava desenvolvimento considerável; na época paleolítica excedia ao que o homem dos outros países fizera na neolítica. O rio, como elemento geográfico e econômico, modela a vida daquele povo dividido em aldeias e, quiçá, em clans. A inundação fertiliza o solo; mas destrói tudo, aniquila. A inteligência tem de criar expedientes captatórios e de irrigação, desenvolver a indústria do sílex e da cerâmica, lavrar a terra, usar o ouro e o cobre. Gasta-se milênio e meio em tão árduo labor; e de tal esforço da época eneolítica (terminologia de Morgan) sai o esboço de civilização. Os pequenos círculos têm de juntar-se; e integrar-se-ão, com a unificação das aldeias ou clans, os estados ou reinos. Mais tarde virá o reino único. Com a escrita, com a associação dos sinais ideográficos e fonéticos, dilatam-se os recursos da pictografia. É a fase da tradição escrita, era histórica da humanidade.” (Pontes de Miranda, 1983: p. 39).
[10] “Os círculos são sistemas em que mais facilmente se procede e se exerce a adaptação. Sem os círculos, a adaptação teria de realizar-se, sem graduações, sem defensivas, entre todos os povos. O círculo como que fecha o sistema e neste terão de operar as leis biológicas que derivam da lei geral de adaptação: variedade, hereditariedade, crescente estabilidade e seleção. Aos círculos correspondem novos sistemas de substituição da luta; ao individualismo sucede o coletivismo da nova forma social. Assim, ao círculo-família cabem instintos que levam à vida em comum algo de menos violento e de mais fecundo, que é o amor paterno, materno, conjugal, filial e fraternal. É à família, e não à partícula humana, que vai ser incumbido o máximo de luta, e, quaisquer seriam as vicissitudes, não há negar que o indivíduo está mais protegido do que estaria se sozinho lutasse. Juntai os grupos, e as alianças, as amizades, as afinidades de idéias e de crenças, e logo compreendereis a grande importância das formações coletivas.” (Pontes de Miranda, 1983: p.13) Com isso, a dilatação do círculo social se deve a um aumento nos grupos que se inserem nele. Por exemplo: de um povoado, onde viviam três famílias, hoje já se constitui uma cidade, onde vivem diversas famílias.
[11] Uma das causas da dilatação dos círculos sociais, neste caso a força, foi à colonização. “Com a intrusão européia desorganiza-se entre os indígenas da América a vida social e econômica; desfaz-se o equilíbrio nas relações do homem com o meio físico. Principia a degradação da raça atrasada ao contato da adiantada; mas essa degradação segue ritmos diversos, por um lado conforme a diferenciação regional de cultura humana ou de riqueza do solo entre os nativos – máxima entre os Incas e Astecas e mínima nos extremos do continente; por outro lado, conforme as disposições e recursos colonizadores do povo intruso ou invasor. Os espanhóis apressam entre os Incas, Astecas e Maias a dissolução dos valores nativos na fúria de destruírem uma cultura já na fase de semicivilização; já na segunda muda; e que por isso mesmo lhes pareceu perigosa ao Cristianismo e desfavorável à fácil exploração das grandes riquezas minerais. Apressam-na entre gentes mais atrasadas, os Puritanos ingleses querendo conservar-se imaculados do contato sexual e social de povos que lhes repugnavam pela diferença de cor e de costumes e que evocavam à sua consciência de raça e de cristãos o espantalho da miscigenação e do paganismo dissoluto. Os portugueses, além de menos ardentes na ortodoxia que os espanhóis e menos que os ingleses nos preconceitos de cor e de moral cristã, vieram defrontar-se na América, não com nenhum povo articulado em império ou em sistema já vigoroso de cultura moral e material – com palácios, sacrifícios humanos aos deuses, monumentos, pontes, obras de irrigação e de exploração de minas – mas, ao contrário, com uma das populações mais rasteiras do continente. De modo que não é o encontro de uma cultura exuberante de maturidade com outra já adolescente, que aqui se verifica; a colonização européia vem surpreender nesta parte da América quase que bandos de crianças grandes; uma cultura verde e incipiente; ainda na primeira dentição; sem os ossos nem o desenvolvimento nem a resistência das grandes semicivilizações americanas... Mas entre os indígenas das terras de pau-de-tinta outras foram as condições de resistência ao europeu: resistência não mineral mas vegetal. Por sua vez o invasor pouco numerosos foi desde logo contemporizando com o elemento nativo; servindo-se do homem para as necessidades de trabalho e principalmente de guerra, de conquista dos sertões de desbravamento do mato virgem; e da mulher para as de geração e de formação de família.” (Freyre, 2001: p. 161-162).
[12] “A gradual descentralização de governo e território, a transferência da terra, do controle do suserano conquistador para o da casta guerreira como um todo, nada mais é que o processo conhecido como ‘feudalização’.” (Elias, 1993).
[13] “1. Alguns dos mecanismos mais importantes que, em fins da Idade Média, foram aumentando o poder da autoridade central de um território podem ser descritos sumariamente neste estágio preliminar. Eles foram, de modo geral, semelhantes em todos os maiores países do Ocidente, e isso pode ser observado com especial clareza no desenvolvimento da monarquia francesa.
A expansão gradual do setor monetário da economia a expensas do setor de troca, ou escambo, em uma dada região na Idade Média gerou conseqüências muito diferentes para a maior parte da nobreza guerreira, por um lado, e para o rei ou príncipe, por outro. Quanto mais moeda entrasse em circulação numa região, maior seria o aumento dos preços. Todas as classes cuja renda não aumentava à mesma taxa, todos aqueles que viviam de renda fixa, ficavam em situação desvantajosa, sobretudo os senhores feudais, que auferiam foros fixos por suas terras.” (Elias, 1993: p. 19).
[14] “Na verdade, nada na história indica que essa mudança tenha sido realizada ‘racionalmente’, através de qualquer educação intencional de pessoas isoladas ou de grupos. A coisa aconteceu de maneira geral, sem planejamento algum, mas nem por isso sem um tipo específico de ordem. Mostramos como o controle efetuado de terceiras pessoas é convertido, de vários aspectos, em autocontrole, que as atividades humanas mais animalescas são progressivamente excluídas do palco da vida comunal e investidas de sentimento de vergonha que a regulação de toda a vida instintiva e afetiva por um firme autocontrole se torna cada vez mais estável, uniforme e generalidade. Isso tudo certamente não resulta de uma idéia central concedida há séculos por pessoas isoladas, e depois implantada em sucessivas gerações como a finalidade da ação e do estado desejados, até se concretizar por inteiro nos ‘séculos de progresso’. Ainda assim, embora não fosse planejada e intencional, essa transformação não constitui uma mera seqüência de mudanças caóticas e não-estruturadas.” (Elias, 1993: p. 193).
[15] Por exemplo a distinção entre nobre e burguês.
[16] A Revolução Francesa veio no sentido de inovar, acabar com as instituições então vigentes e implantar outras, aniquilando os privilégios estamentais, vigorantes no regime feudal. Possibilitou, assim, uma proteção a todos os cidadãos franceses, principalmente aos burgueses. Neste empreendimento revolucionário, importante foi a idéia geral e abstrata tida de Homem, levando, não só à França, mas para o mundo, a intenção da valorização, em relação à antiga idéia, e proteção de direitos. Prerrogativas essas adquiridas apenas pela condição de ser Humano. “Os revolucionários de 1789, ao contrário, julgavam-se apóstolos de um mundo novo, a ser anunciado a todos os povos e em todos os tempos vindouros. Nos debates da Assembléia Francesa sobre a redação da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, multiplicaram-se as intervenções de deputados nesse sentido. Démeunier afirmou, na sessão de 3 de agosto, que ‘esses direitos são de todos os tempos e de todas as nações’. Mathieu de Montmorency repetiu, em 8 de agosto: ‘os direitos do homem em sociedade são eternos, (...) invariáveis como a justiça, eternos como a razão; eles são de todos os tempos e de todos os países’. Pétion, que foi maire de Paris, considerou normal que a Assembléia se dirigisse a toda a humanidade: ‘Não se trata aqui de fazer uma declaração de direitos unicamente para a França, mas para o homem em geral’.” (Comparato, 2001: p. 128).
[17] Nota de rodapé número 79 do livro História do Direito Privado Moderno de FRANZ WIACKER, que diz o seguinte: “Lê Lys rouge, cap. VIII, I; no contexto de um requisitório socialista do antigo comunardo Choulette contra a revolução francesa que tinha reservado os seus frutos para a burguesia do terceiro estado: ‘Sim, somos burgueses... Isto significa para os pobres manter e agüentar os ricos na sua ociosidade. Eles têm que trabalhar sob a igualdade majestática das leis que proíbem tanto aos pobres como aos ricos dormir de baixo das pontes pedir pelas ruas e roubar pão. Isto foi um dos frutos da revolução. Pois esta revolução foi pelos tolos e pelos idiotas saqueadores do patrimônio nacional e, no fundamental, apenas conseguiu enriquecer os proprietários rurais e os rendeiros burgueses, pondo no trono a riqueza sob o nome da igualdade. E o que eu aqui digo nunca poderia ser impressa.” (Wiacker, 1997: p. 523).
[18] “Aumentando a divisão de funções, e com ela a interdependência mútua de todas, esse tipo de mudança no equilíbrio de poder não se expressou mais pela tendência de dispensar oportunidades monopolizadas entre numerosos indivíduos, mas pela tendência de controlar os centros monopolistas e as oportunidades que eles distribuíam de maneira diferente. A primeira grande fase de transição desse tipo, a luta das classes burguesas pelo controle dos velhos centros monopolistas, controlados pelos reis e, em parte, pela aristocracia - como propriedade hereditária – os primeiros monopólios completos dos tempos modernos – mostram isso com grande clareza. Por muitas razões, é mais complexo em nossos dias o modelo de classes em ascensão. Uma das razões é que hoje se tornou necessário lutar não só pelos velhos centros monopolistas de tributação e violência física, ou apenas pelos monopólios econômicos recentes ainda em processo de formação, mas pelo controle simultâneo de ambos. O tipo elementar de forças em ação neste particular, porém, é muito simples, mesmo neste caso: toda a oportunidade de criação de monopólios limitada pela hereditariedade a certas famílias gera tensões e desproporções específicas na sociedade interessada. Tensões desse tipo tendem para uma mudança de relações e, por isso, de instituições em todas as sociedades, embora, quando a diferenciação é baixa e, especialmente, quando a classe superior consiste de guerreiros, elas freqüentemente permaneçam sem solução. Sociedades com uma divisão de funções altamente desenvolvida são muito mais sensíveis às desproporções e disfunções ocasionados por essas tensões, cujos efeitos são permanentemente sentidos em todo a sociedade. Embora, nestas sociedades, possa haver mais de uma maneira pelas quais as tensões podem ser conciliadas e removidas, a direção a que tendem para se transcenderem é predeterminada pelo modo como vieram a surgir, por sua gênese. As tensões, desproporções e disfunções do controle monopolistas de oportunidades, no interesse de alguns, só podem ser resolvidos pela destruição desse controle. O que não se pode saber de antemão, porém, é quanto tempo vai durar a luta que se seguirá.” (Elias, 1993: p. 266).
[19] “A forma oposta de solidariedade, a orgânica, é aquela em que o consenso, isto é, a unidade coerente da coletividade, resulta de uma diferenciação, ou se exprime por seu intermédio. Os indivíduos não se assemelham, são diferentes. E, de certo modo, são diferentes porque o consenso se realiza.” (Aron, 2000: p. 288).
[20] “Nas palavras de John Kavanagh, do Instituto de Pesquisa Política de Washington, ‘A globalização deu mais oportunidades aos extremamente ricos de ganhar dinheiro mais rápido. Esses indivíduos utilizam a mais recente tecnologia para movimentar largas somas de dinheiro mundo afora com extrema rapidez e espetacular com eficiência cada vez maior.’”. (Bauman, 1999: . p. 79).
[21] A educação é todo o ato que a criança apreende algo cognitiva e intelectivamente. Muitas vezes, a educação se dá de maneira imperceptível aos sentidos do educador.
[22] “personalidade. [Do lat. trad. Personalitate.] S. f. 1. Caráter ou qualidade do que é pessoal; pessoalidade. 2. O que determina a individualidade duma pessoa moral.” (Ferreira, 1999: p. 1552).
[23] “A assimilação é um processo subjetivo que envolve a filtragem do mundo através do próprio sistema de conhecimento da pessoa – uma adoção de novas experiências através da estrutura mental estabelecida, daquela pessoa. A acomodação envolve o ajuste do conhecimento de uma pessoa às demandas da realidade do ambiente, pela reorganização ou modificação da estrutura cognitiva existente. Tomadas juntas, a assimilação e a acomodação permitem que a criança se adapte ao mundo exterior e reaja com padrões crescentemente complexos de conscientização e comportamento, o que é chamado de organização.” (Kaplan e Sadock, 1990: p. 87).
[24] “Segundo o grande psicólogo, e profundo pensador Carl Jung a personalidade saudável é aquela que consegue o equilíbrio entre o consciente e o inconsciente, entre a Vida interior e exterior. Mais que qualquer outra escola psicológica, a psicologia analítica de Jung busca a unidade do indivíduo no mais profundo de si mesmo, com uma técnica que conduz à individuação. A Personalidade saudável é ‘UMA’ e dependemos em proporções angustiantes de um funcionamento pontual do nosso psiquismo inconsciente, dos seus referentes e das suas falhas ocasionais. Portanto a personalidade de cada indivíduo apresenta traços próprios, ou seja modos originais de perceber e reagir ao mundo exterior, que se repetem em múltiplas situações ao longo da sua Vida que de certo modo o individualizam e o distinguem das outras pessoas. É só quando esses traços da personalidade se acentuam demasiado, tornam-se incoerentes, inflexíveis, desadaptados à realidade habitual, prejudicando até as formas diversas de actuar perante as mesmas situações, é que há um distúrbio de personalidade.” (Chaves, 2003).
[25] “Personalidade anti-social. Psiq. Distúrbio de personalidade que se caracteriza, fundamentalmente, por falta de socialização (3), o que resulta em conflito com a sociedade e a deformidade de caráter, não observando o indivíduo as suas obrigações em relações a outros indivíduos, a grupos, ou a convenções sociais, e mostrando intolerância, frustração, impulsividade, egoísmo, falta de autocensura, incapacidade de aprender com base em seus próprios erros, irresponsabilidade. [Sin.: personalidade psicopática e personalidade sociopática.]” (Ferreira, 1999: p. 1552). (grifo do autor)
[26] KAPLAN & SADOCK, ob. cit. p. 460. “Diagnóstico diferencial. O distúrbio da personalidade anti-social pode ser diferenciado do comportamento ilegal, no sentido em que pode envolver muitas áreas da vida da pessoa. Se o comportamento anti-social for a única manifestação, tais pacientes são diagnosticados na categoria do DSM-III-R denominada ‘condição não atribuíveis a um distúrbio mental’. Dorothy Lewis demonstrou, entretanto, que muitos destes pacientes portam um distúrbio neurológico ou mental que foi negligenciado ou não diagnosticado. Mais difícil é a distinção entre o distúrbio da personalidade anti-social e o distúrbio por abuso de substâncias. Quando o distúrbio por abuso de substâncias quanto ao comportamento anti-social começam durante a infância e persistem na vida adulta, ambos devem ser diagnosticados. Quando, entretanto, o comportamento anti-social é claramente secundário ao abuso pré-mórbido de álcool ou drogas, o diagnóstico de distúrbio da personalidade anti-social não é indicado.” (Kaplan e Sadock, 1990: p. 461).
[27] (Kaplan e Sadock, 1990: p. 460). Ainda, discorre o autor: “São altamente manipuladoras e frequentemente capazes de convencer outras pessoas a participarem de esquemas que envolvam modos fáceis de obter dinheiro ou de adquirir fama e notoriedade, e o que eventualmente pode levar os incautos à ruína, embaraço social, ou ambos. As personalidades anti-sociais não falam a verdade e não se pode confiar nelas para levarem adiante qualquer projeto ou aderirem a qualquer padrão convencional de moralidade. Promiscuidade, abuso de cônjuge, abuso infantil e condução de veículos sob os eleitos do álcool são eventos comuns na vida desses pacientes. Um achado digno de nota é uma falta de remorsos por tais ações; ou seja, estes pacientes parecem desprovidos de consciência.”
[28] “Características clínicas. As personalidades anti-sociais freqüentemente apresentam um exterior normal e até mesmo agradáveis e cativantes. Suas histórias revelam, entretanto, muitas áreas de funcionamento vital desordenado. Mentiras, faltas à escola, fugas de casa, furtos, brigas, abusos de drogas e atividades ilegais são experiências típicas que os pacientes relatam ter começado durante a infância. As personalidades anti-sociais freqüentemente impressionam os clínicos do sexo oposto com seus aspectos exuberantes e sedutores, mas os clínicos do mesmo sexo podem considera-las manipuladoras e exigentes. As personalidades anti-sociais demonstram uma falta de ansiedade ou depressão que pode parecer grosseiramente incongruente com suas situações, e suas próprias explicações do comportamento anti-social fazem-no parecer algo impensado. Ameaças de suicídio e preocupações somáticas podem ser comuns. Ainda assim, o conteúdo mental do paciente revela a completa ausência de delírios e outros sinais de pensamento irracional. De fato, eles freqüentemente demonstram um senão aumentado de teste de realidade. Freqüentemente impressionam os observadores por terem uma boa inteligência verbal.” (Kaplan e Sadock, 1990: p. 460).
[29] “Epidemiologia. A prevalência do distúrbio da personalidade anti-social é de 3% nos homens e 1% entre mulheres. É comum nas áreas urbanas pobres e entre os residentes móveis daquelas áreas. Os meninos com os distúrbios vêm de famílias maiores do que as das garotas. O aparecimento dos distúrbios ocorre antes dos 15 anos. As mulheres geralmente desenvolvem os sintomas antes da puberdade e os homens, até mesmo antes. Nas populações carcerárias, a prevalência da personalidade anti-social pode chegar a 75%. Um padrão familiar está presente, no sentido em que este distúrbio é mais comum entre parentes em primeiro grau de homens com o distúrbio do que entre os controles.” (Kaplan e Sadock, 1990: p. 460).
[30] Numa visão atenta, a banda de rock nacional Legião Urbana, no CD A Tempestade (de 1996), percucientemente abstrai da realidade a seguinte observação: “...Digam o que disserem – O mal do século é a solidão – Cada um de nós imerso em sua própria arrogância – Esperando por um pouco de afeição ...” frases retiradas da faixa 13 com o título: Esperando Por Mim.
[31] “O que se pode efetivamente observar é o seguinte: com a crescente mudança nas relações entre os seres humanos e as forças naturais extra-humanas, estas últimas vão aos poucos perdendo terreno como elemento da noção de um ‘mundo externo’ oposto ao ‘mundo interno’ humano. Em lugar delas, o abismo entre a parte ‘interna’ do indivíduo e as outras pessoas, entre o verdadeiro eu interior e a sociedade ‘externa’, desloca-se para o primeiro plano. À medida que os processos naturais se tornam mais fáceis de controlar, parece que nossa relativa falta de controle sobre as relações entre as pessoas e, em particular, entre os grupos, bem como os insuperáveis obstáculos erguidos contra as inclinações pessoais pelas exigências sociais, se tornam muito mais perceptível. Desse modo, perpetua-se o símbolo metafísico da individualização crescente, a idéia que o indivíduo tem de que seu eu interior está isolado do mundo lá fora como que por um muro invisível...” (Elias, 1994: p. 106).
[32] “Em palavras mais simples, toda a pessoa é, em certo sentido, um estranho, um marginal num aspecto ou noutro; não pertencendo a qualquer entidade ‘total’ mas forçados a inter-agir com muitas dessas entidades, os ‘indivíduos são ainda mais induzidos a interpretar a diferença entre eles próprios e o meio ambiente... em termos da sua própria pessoa, pelo que o ego se torna o ponto focal de todas as suas experiências interiores e o meio ambiente perde a maioria dos seus contornos’.” (Bauman, 1989: p. 70).
[33] “Do ponto de vista de Luhmann, esta alienação de toda e qualquer pessoa em relação a todo e qualquer ‘sub-sistema’ dentro da sociedade, abre um vasto espaço para o desenvolvimento individual e permite que a vida interior do indivíduo alcance uma profundidade e riqueza nunca atingidas em condições de rigoroso controlo comunal. Porém, por outro lado, a alienação mútua dos indivíduos põe em dúvida a própria continuação da comunicação inter-pessoal; na verdade, um discurso e um acordo significativos tornam-se improváveis. Para que a comunicação aconteça apesar disto, as experiências interiores dos seus intervenientes organizadas à volta de pontos focais separados têm de ser validadas inter-subjetivamente, isto é, socialmente. Segundo Luhmann, esta validação é na verdade consumada numa sociedade moderna através do amor: um meio de comunicação consentido e apoiado, em que os intervenientes que inter-agem reconhecem reciprocamente a validade e relevância da experiência interior uns dos outros – cada parceiro encarando a experiência interior do outro como real, tomando-a como motivo de sua própria acção.” (Bauman, 1989: p. 71).
[34] “Pode-se compreender agora como a psiquiatria da pós-modernidade se constrói na direção definida da pesquisa e interesse clínico pelas perturbações funcionais do humor, sejam estas depressões ou síndrome do pânico, na medida em que nestas perturbações do espírito, o sujeito não consegue ser cidadão na sociedade do espetáculo. Com efeito, panicados e deprimidos são fracassados na cultura do narcisismo, pois não conseguem ocupar a cena teatral da sociedade com o peito inflado e o eu obeso de si mesmo e dizerem decididamente: Cheguei.” (Birman, 2001: p. 247).
[35] “A vida organizada em torno do consumo, por outro lado, deve se bastar sem normas: ela é orientada pela sedução, por desejos sempre crescentes e quereres voláteis – não mais por regulação normativa. Nenhum vizinho em particular oferece um ponto de referência para uma vida de sucesso; uma sociedade de consumidores se baseia na comparação universal – e o céu é o único limite.” (Bauman, 2001: p. 90).
[36] “De Nova York, a doutrina da ‘tolerância zero’, instrumentos de legitimação da gestão policial e judiciária da pobreza que incomoda – o que se vê, a que causa incidentes e desordens no espaço público, alimentando, por conseguinte, uma difusa sensação de insegurança ou simplesmente de incômodo tenaz e de inconveniência -, propagou-se através do globo a uma velocidade alucinante. E com ela a retórica militar da ‘guerra’ ao crime e da ‘reconquista’ do espaço público, que assimila os delinqüentes (reais ou imaginários), sem-teto, mendigos e outros marginais a invasores estrangeiros – o que facilita o amálgama com a imigração sempre rendosa eleitoralmente.” (Wacquant, 2001: p. 30). (grifo do autor)
[37] “Com efeito, a acusação fundamental que Marcuse faz à sociedade altamente desenvolvida, e em particular à americana, é de ser desumana. E é desumana porque coloca e mantém o homem num meio irracional e repressivo e, portanto, em contraste com suas prerrogativas fundamentais: a razão e a liberdade.” (Nogare, 1990: p. 199). (grifo do autor)
[38] “O que os povos democráticos ou em que o Estado é democrático e liberal têm de fazer, como fim principal, é diminuir a desigualdade humana. Os Homens são desiguais, mas é preciso que, em vez de continuar ou aumentar a desigualdade, se façam menos desiguais. Têm de ser preparados e educados, alimentados e vestidos, e terem casa, de modo que possam produzir mais, concorram para melhor sorte comum, a maior colaboração social e a menor criminalidade.” (Pontes de Miranda, 2002. p. 771).

2 Comments:

Blogger eduengler said...

Agora no texto certo.

Excelente texto!
É seu? Posso repassá-lo?

9:02 AM  
Blogger Unknown said...

ele é muito grande sera q nao dava para por um mais resumido

1:52 PM  

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